No Future
«Quase quatro décadas depois do movimento "punk" dos Sex Pistols e do seu "No Future", os portugueses chegaram finalmente à mesma conclusão. Isto não tem mesmo futuro. Onde "isto" é a nossa sociedade, o nosso país, a nossa vida.
Não o fazem por via do radicalismo cultural, que por cá nunca existiu, mas porque, para além de lhes faltar dinheiro no bolso, perderam qualquer perspetiva de futuro. Os jovens estudantes não sabem se uma vez terminado o curso conseguirão arranjar trabalho; os empregados não sabem por quanto mais tempo o serão; os que descontaram toda a vida não sabem se ainda irão receber a reforma; os doentes não sabem se o Hospital continuará a tratá-los ou se, por falta de verbas, os deixará morrer; os pais olham para os filhos e temem pela sua sorte. E não ficamos por aqui. Uns dizem que o Euro vai acabar, outros que é a própria Europa que tem os dias contados. Alguém sugere que Portugal soberano já deixou de existir pois é governado por uma troika. O próprio Passos Coelho, para animar, aconselha os portugueses a partir, se possível, de vez. Enfim, "sem futuro" é o hino do Portugal de 2012.
E, no entanto, acreditar no futuro é fundamental para a sociedade em que nos calhou viver. Alguns dizem que é uma forma de crença como outra qualquer. Talvez, mas é mais do que isso. O futuro, mais do que o passado, é uma parte essencial do nosso presente. O passado é memória, património, venera-se na ilusão de que existem identidades imutáveis. A realidade é, porém, diferente. As identidades são dinâmicas e estão em permanente transformação. Mesmo na nossa vida. Ontem fomos filhos, hoje somos pais. Que mudança radical de identidade! Ontem Portugal foi um país fechado e rural, hoje estamos no mundo e ou fazemos parte da conversa ou estamos perdidos.
Porque, como disse, o futuro é parte constituinte do nosso presente. Estuda-se para ter futuro. Investe-se para garantir um rendimento no futuro. Cria-se para fazer já hoje o que, de outra maneira, só seria possível amanhã. Um empresário pensa no que é que as pessoas gostariam de ter e ainda não têm. Um político afirma-se pelo que diz ir fazer se for eleito.
Mas o futuro está presente também de outra forma. Vivemos na sociedade das novas tecnologias. E são novas também porque integram em si a sua própria superação. Ou seja, são tecnologias evolutivas. Um programa de computador nunca está finalizado, é um "work in progress". Logo à partida sabe-se que a seguir ao 1.0 virá o 2.0. Esta constante mudança está no seu código genético.
O que significa que tudo muda, a arquitetura, mas também o uso. No curto espaço das nossas vidas quantos sistemas operativos, quantos telemóveis, quantas funcionalidades e "gadgets" não nos obrigaram a sucessivas e constantes adaptações? E quanto mais se muda mais se promove a mudança.
Pensar que se pode parar este movimento, imaginar, como faz este governo, que temos agora dois ou três anos de estagnação e empobrecimento, e depois tudo regressa ao normal, é não só alimentar uma tremenda ilusão, como não perceber nada do mundo contemporâneo. Esta é uma corrida implacável. Que o digam tantas e tantas empresas que não se modernizaram e simplesmente faliram. Que o digam todos aqueles que pensaram que não iam perder tempo com computadores, internets e outras modernices e hoje são perfeitos analfabetos.
Enfim, Portugal está em recessão económica e está em vias de regredir como civilização. O desprezo governamental pelo ensino, pela cultura, pela ciência e pela inovação, que aliás se imagina ser um mero slogan, está a impedir o país de existir no seu próprio tempo. Mas é o desprezo pelas pessoas que configura o maior desastre.
Não existem dados estatísticos mas vários investigadores da área afirmam que a emigração de quadros, vulgo "cérebros", é enorme. Aos milhares. Não estamos já a falar de "malas de cartão" e trolhas para a construção civil na Europa, mas de engenheiros, arquitetos, cientistas, que vão deixar o país num verdadeiro estado de penúria no campo da inteligência. Ou seja, Portugal está a ficar cada vez mais estúpido. Objetivamente sem destino nem futuro.» [Jornal de Negócios]
Não o fazem por via do radicalismo cultural, que por cá nunca existiu, mas porque, para além de lhes faltar dinheiro no bolso, perderam qualquer perspetiva de futuro. Os jovens estudantes não sabem se uma vez terminado o curso conseguirão arranjar trabalho; os empregados não sabem por quanto mais tempo o serão; os que descontaram toda a vida não sabem se ainda irão receber a reforma; os doentes não sabem se o Hospital continuará a tratá-los ou se, por falta de verbas, os deixará morrer; os pais olham para os filhos e temem pela sua sorte. E não ficamos por aqui. Uns dizem que o Euro vai acabar, outros que é a própria Europa que tem os dias contados. Alguém sugere que Portugal soberano já deixou de existir pois é governado por uma troika. O próprio Passos Coelho, para animar, aconselha os portugueses a partir, se possível, de vez. Enfim, "sem futuro" é o hino do Portugal de 2012.
E, no entanto, acreditar no futuro é fundamental para a sociedade em que nos calhou viver. Alguns dizem que é uma forma de crença como outra qualquer. Talvez, mas é mais do que isso. O futuro, mais do que o passado, é uma parte essencial do nosso presente. O passado é memória, património, venera-se na ilusão de que existem identidades imutáveis. A realidade é, porém, diferente. As identidades são dinâmicas e estão em permanente transformação. Mesmo na nossa vida. Ontem fomos filhos, hoje somos pais. Que mudança radical de identidade! Ontem Portugal foi um país fechado e rural, hoje estamos no mundo e ou fazemos parte da conversa ou estamos perdidos.
Porque, como disse, o futuro é parte constituinte do nosso presente. Estuda-se para ter futuro. Investe-se para garantir um rendimento no futuro. Cria-se para fazer já hoje o que, de outra maneira, só seria possível amanhã. Um empresário pensa no que é que as pessoas gostariam de ter e ainda não têm. Um político afirma-se pelo que diz ir fazer se for eleito.
Mas o futuro está presente também de outra forma. Vivemos na sociedade das novas tecnologias. E são novas também porque integram em si a sua própria superação. Ou seja, são tecnologias evolutivas. Um programa de computador nunca está finalizado, é um "work in progress". Logo à partida sabe-se que a seguir ao 1.0 virá o 2.0. Esta constante mudança está no seu código genético.
O que significa que tudo muda, a arquitetura, mas também o uso. No curto espaço das nossas vidas quantos sistemas operativos, quantos telemóveis, quantas funcionalidades e "gadgets" não nos obrigaram a sucessivas e constantes adaptações? E quanto mais se muda mais se promove a mudança.
Pensar que se pode parar este movimento, imaginar, como faz este governo, que temos agora dois ou três anos de estagnação e empobrecimento, e depois tudo regressa ao normal, é não só alimentar uma tremenda ilusão, como não perceber nada do mundo contemporâneo. Esta é uma corrida implacável. Que o digam tantas e tantas empresas que não se modernizaram e simplesmente faliram. Que o digam todos aqueles que pensaram que não iam perder tempo com computadores, internets e outras modernices e hoje são perfeitos analfabetos.
Enfim, Portugal está em recessão económica e está em vias de regredir como civilização. O desprezo governamental pelo ensino, pela cultura, pela ciência e pela inovação, que aliás se imagina ser um mero slogan, está a impedir o país de existir no seu próprio tempo. Mas é o desprezo pelas pessoas que configura o maior desastre.
Não existem dados estatísticos mas vários investigadores da área afirmam que a emigração de quadros, vulgo "cérebros", é enorme. Aos milhares. Não estamos já a falar de "malas de cartão" e trolhas para a construção civil na Europa, mas de engenheiros, arquitetos, cientistas, que vão deixar o país num verdadeiro estado de penúria no campo da inteligência. Ou seja, Portugal está a ficar cada vez mais estúpido. Objetivamente sem destino nem futuro.» [Jornal de Negócios]
Autor:
Leonel Moura.
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