Portugal, na opinião de uma cidadã brasileira
Ruth Manus é advogada e professora universitária
Escreve um blogue num jornal de S. Paulo
Dentre as coisas que mais detesto, duas podem ser destacadas:
ingratidão e pessimismo. Sou incuravelmente grata e optimista e,
comemorando quase dois anos em Lisboa, sinto que devo a Portugal o
reconhecimento de muitas coisas incríveis que existem aqui embora me
pareça que muitos nem se apercebem.
Não estou dizendo que Portugal seja perfeito porque nenhum lugar é.
Nem os portugueses são, nem os brasileiros, nem os alemães, nem
ninguém. Mas para olharmos os defeitos e os pontos negativos basta
abrir qualquer jornal, como fazemos diariamente. Mas acredito que
Portugal tem certas características nas quais o mundo inteiro deveria
inspirar-se.
Para começar, o mundo deveria aprender a cozinhar como os portugueses.
Os franceses aprenderiam que aqueles pratos com porções minúsculas não
alegram ninguém. Os alemães descobririam outros acompanhamentos além
da batata. Os ingleses aprenderiam tudo do zero.
Bacalhau e pastel de nata ? Não. Estamos falando de muito mais. Arroz
de pato, arroz de polvo, alheira, peixe fresco grelhado, ameijoas,
plumas de porco preto, grelos salteados, arroz de tomate, baba de
camelo, arroz doce, bolo de bolacha, ovos moles. Mais do que isso, o
mundo deveria aprender a se relacionar com a terra como os portugueses
se relacionam.
Conhecer a época das cerejas, das castanhas e da vindima. Saber que o
porco é alentejano, que o vinho do Porto é do Douro. Talvez o pequeno
território permita que os portugueses conheçam melhor o trajecto dos
alimentos até à sua mesa, diferente do que ocorre, por exemplo, no
Brasil.
O mundo deveria saber ligar a terra à família e à história como os
portugueses. A história da quinta do avô, as origens transmontanas da
família, as várias receitas típicas da aldeia onde nasceu a avó. O
mundo não devia deixar o passado escoar tão rapidamente por entre os
dedos. E embora alguns digam que Portugal vive do passado, tenho
certeza de que é isso o que os faz ter raízes tão fundas e fortes.
O mundo deveria ter o balanço entre a rigidez e a afecto que têm os portugueses.
De nada adiantam a simpatia e o carisma brasileiros se eles nos
impedem de agir com a seriedade e a firmeza que determinados assuntos
exigem. O deputado Jair Bolsonaro que defende ideias piores que as de
Donald Trump emergiu como piada e hoje se fortalece como descuido no
nosso cenário político.
Nem Bolsonaro nem Trump passariam em Portugal. Os portugueses - de
direita ou de esquerda - não riem desse tipo de figura nem permitem
que elas floresçam. Ao mesmo tempo de nada adianta o rigor japonês que
acaba em suicídio ou a frieza nórdica que resulta na ausência de
vínculos.
Os portugueses são dos poucos povos que sabem dosear rigidez e afecto,
acidez e doçura, buscando sempre a medida correcta de cada elemento,
ainda que de forma inconsciente. Todo país do mundo deveria ter uma
data como o 25 de Abril para celebrar. Se o Brasil tivesse uma data
para celebrar o fim da ditadura, talvez não observássemos com tanta
dor a fragilidade da nossa democracia. Todo país deveria fixar o que é
passado e o que é futuro através de datas como essa.
Todo idioma deveria conter afecto nas palavras corriqueiras como o
português de Portugal transporta. Gosto de ser chamada de "miúda".
Gosto de ver os meninos brincando e ouvir seus pais chama-los
carinhosamente de "putos". Gosto do uso constante de diminutivos.
Gosto de ouvir ”magoei-te ?” quando alguém pisa no meu pé. Gosto do
uso das palavras de forma doce.
O mundo deveria aprender a ter modéstia como os portugueses muito
embora os portugueses devessem orgulhar-se mais do seu país do que
costumam. Portugal usa suas melhores características para aproximar as
pessoas, não para afastá-las. A arrogância que impera em tantos países
europeus, passa muito longe dos portugueses. O mundo deveria saber
olhar para dentro e para fora como Portugal sabe. Portugal não vive
centrado em si próprio como fazem franceses e os norte- americanos.
Por outro lado não ignora importantes questões internas priorizando
somente o que vem de fora, como ocorre com tantos países colonizados.
Portugal é um país muito mais equilibrado do que a média e é muito
maior do que parece.
ingratidão e pessimismo. Sou incuravelmente grata e optimista e,
comemorando quase dois anos em Lisboa, sinto que devo a Portugal o
reconhecimento de muitas coisas incríveis que existem aqui embora me
pareça que muitos nem se apercebem.
Não estou dizendo que Portugal seja perfeito porque nenhum lugar é.
Nem os portugueses são, nem os brasileiros, nem os alemães, nem
ninguém. Mas para olharmos os defeitos e os pontos negativos basta
abrir qualquer jornal, como fazemos diariamente. Mas acredito que
Portugal tem certas características nas quais o mundo inteiro deveria
inspirar-se.
Para começar, o mundo deveria aprender a cozinhar como os portugueses.
Os franceses aprenderiam que aqueles pratos com porções minúsculas não
alegram ninguém. Os alemães descobririam outros acompanhamentos além
da batata. Os ingleses aprenderiam tudo do zero.
Bacalhau e pastel de nata ? Não. Estamos falando de muito mais. Arroz
de pato, arroz de polvo, alheira, peixe fresco grelhado, ameijoas,
plumas de porco preto, grelos salteados, arroz de tomate, baba de
camelo, arroz doce, bolo de bolacha, ovos moles. Mais do que isso, o
mundo deveria aprender a se relacionar com a terra como os portugueses
se relacionam.
Conhecer a época das cerejas, das castanhas e da vindima. Saber que o
porco é alentejano, que o vinho do Porto é do Douro. Talvez o pequeno
território permita que os portugueses conheçam melhor o trajecto dos
alimentos até à sua mesa, diferente do que ocorre, por exemplo, no
Brasil.
O mundo deveria saber ligar a terra à família e à história como os
portugueses. A história da quinta do avô, as origens transmontanas da
família, as várias receitas típicas da aldeia onde nasceu a avó. O
mundo não devia deixar o passado escoar tão rapidamente por entre os
dedos. E embora alguns digam que Portugal vive do passado, tenho
certeza de que é isso o que os faz ter raízes tão fundas e fortes.
O mundo deveria ter o balanço entre a rigidez e a afecto que têm os portugueses.
De nada adiantam a simpatia e o carisma brasileiros se eles nos
impedem de agir com a seriedade e a firmeza que determinados assuntos
exigem. O deputado Jair Bolsonaro que defende ideias piores que as de
Donald Trump emergiu como piada e hoje se fortalece como descuido no
nosso cenário político.
Nem Bolsonaro nem Trump passariam em Portugal. Os portugueses - de
direita ou de esquerda - não riem desse tipo de figura nem permitem
que elas floresçam. Ao mesmo tempo de nada adianta o rigor japonês que
acaba em suicídio ou a frieza nórdica que resulta na ausência de
vínculos.
Os portugueses são dos poucos povos que sabem dosear rigidez e afecto,
acidez e doçura, buscando sempre a medida correcta de cada elemento,
ainda que de forma inconsciente. Todo país do mundo deveria ter uma
data como o 25 de Abril para celebrar. Se o Brasil tivesse uma data
para celebrar o fim da ditadura, talvez não observássemos com tanta
dor a fragilidade da nossa democracia. Todo país deveria fixar o que é
passado e o que é futuro através de datas como essa.
Todo idioma deveria conter afecto nas palavras corriqueiras como o
português de Portugal transporta. Gosto de ser chamada de "miúda".
Gosto de ver os meninos brincando e ouvir seus pais chama-los
carinhosamente de "putos". Gosto do uso constante de diminutivos.
Gosto de ouvir ”magoei-te ?” quando alguém pisa no meu pé. Gosto do
uso das palavras de forma doce.
O mundo deveria aprender a ter modéstia como os portugueses muito
embora os portugueses devessem orgulhar-se mais do seu país do que
costumam. Portugal usa suas melhores características para aproximar as
pessoas, não para afastá-las. A arrogância que impera em tantos países
europeus, passa muito longe dos portugueses. O mundo deveria saber
olhar para dentro e para fora como Portugal sabe. Portugal não vive
centrado em si próprio como fazem franceses e os norte- americanos.
Por outro lado não ignora importantes questões internas priorizando
somente o que vem de fora, como ocorre com tantos países colonizados.
Portugal é um país muito mais equilibrado do que a média e é muito
maior do que parece.
Acho que o mundo seria melhor se fosse um pouco mais parecido com Portugal.
Essa sorte pelo menos, nós brasileiros, tivemos!
Essa sorte pelo menos, nós brasileiros, tivemos!
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